domingo, 10 de abril de 2016

AS SMART CITIES SÃO DOS “SMART GUYS”?


A revista Smart Cities traz um elogio, merecido, à empresa municipal Cascais Ambiente.
O esforço que esta empresa tem feito na modernização das recolhas seletivas é notório e merecedor de aplauso.
É afinal a continuação de uma estratégia iniciada logo com a criação da Empresa, nos idos 2005, a que tive a honra de ter estado ligado.
Mas não foi um percurso linear, este que a EMAC, agora Cascais Ambiente realizou.
O desenho inicial da estratégia para os Resíduos foi posto em causa por Carlos Carreiras em 2007 e entrou-se num processo de navegação à vista, do pequeno folclore, ao invés de uma estratégia de resíduos sedimentada.
Foram tempos de política espetáculo em substituição do cumprimento de uma estratégia de futuro.
E se este projeto se enquadra também nesta nova forma de gerir resíduos (ou outra coisa qualquer, pois em Cascais tudo pode ser reduzido a espetáculo!...) não é menos verdade que é um passo importante para melhorar a eficácia das recolhas e por essa via diminuir custos, económicos e ambientais. Por isso, e apesar de se perceber uma profunda falta de profundidade estratégica nisto tudo, são devidos os Parabéns à empresa e aos seus gestores e trabalhadores.
Mas, a leitura desta notícia deve levar-nos a um aprofundamento desta questão, a saber:
As medidas tomadas permitem perceber a sustentabilidade das recolhas selectivas ou mesmo o seu incremento?
O que é que a Câmara de Cascais desenhou como nova estratégia depois de ter forçado o abandono do Plano Estratégico de RSU de Cascais, Mafra, Oeiras e Sintra tal como tinha sido desenhado em 2003?
Dei-me ao trabalho de investigar um pouco e o que descobri confirma o que afirmei em 2010: A Câmara Municipal de Cascais, ao acatar a teimosia de Carlos Carreiras e as suas posições acerca desta matéria da gestão de Resíduos acabou por prejudicar gravemente a manutenção do sistema tal como tinha sido desenhado, sem conseguir encontrar uma solução alternativa igualmente sustentável!
Olhemos para o que aconteceu no período 2010 – 2014:
Recolhas seletivas
Ano
Residuos recolhidos (ton)
Variação anual
2010
12096,3

2011
12189,24
0,8%
2012
11865,08
-2,7%
2013
11484
-3,2%
2014
9292
-19,1%

A variação de Recolhas selectivas no período considerado é de -23%!



Recolha indiferenciada
Ano
Residuos Indiferenciados recolhidos (ton)
Variação anual
2010
92012,12

2011
89556,88
-3%
2012
85523,82
-5%
2013
84809
-1%
2014
84883
0%

A variação de Recolhas de RSU indiferenciado no período considerado é de
-7,7%!

Sendo a variação total de RSU recolhidos de – 9,5%, os valores da variação verificados para as recolhas selectivas (resíduos recicláveis) de – 23% significam que há um retrocesso na adesão dos munícipes à reciclagem de RSU.
Cascais está a reciclar menos per capita!
Em 2010 os recicláveis representaram 11,6% dos RSU recolhidos enquanto que em 2014 os recicláveis representaram apenas 9,9% dos RSU total.
Isto quer dizer que a separação diminui e os materiais recicláveis passam a ser recolhidos no indiferenciado porque as pessoas deixam de separar.
Porque é que isto acontece?
Porque a Câmara de Cascais em vez de investir em melhorar o interface entre o munícipe e o serviço de recolha, facilitando a forma de contentorização e diminuindo a distância do contentor à habitação do munícipe, preferiu instalar contentorização enterrada de maior capacidade, o que fez diminuir o número de contentores e aumentou a distância do contentor à habitação do munícipe.
A Câmara preocupou-se em facilitar o seu trabalho aumentando o trabalho reservado ao munícipe…
Claro, tinha que haver desistências!
Enquanto continuar a ser mais trabalhoso separar do que não o fazer, não existindo qualquer benefício para o munícipe cumpridor da separação, que mantém consciência ambiental, o resultado continuará a ser este, diminuição anual da fracção de RSU recolhida selectivamente!
E outra componente sagrada para uma estratégia de incremento da reciclagem é a sensibilização. E sobre isto a Câmara de Cascais fez zero!
Carlos Carreiras convenceu-se que com uma iniciativa anual de recolha de lixo nas praias ou no fundo do mar, com direito a fotos nos jornais e quem sabe uma reportagem numa televisão, a sensibilização estava feita!
Erro crasso. O espectáculo é garantido mas reciclar é uma actividade continuada ao longo do ano. Para isso, é preciso muito mais!
O estranho é que os estudos feitos em 2005 provavam isto tudo mas na Câmara de Cascais preferiram ignorar.
É triste.
Cascais até pode vir a ser uma “Smart Citie” mas para isso vai precisar de ser governada por “Smart Guys”!

Isso, de momento, não é o caso!

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