Este tema é ciclicamente colocado no centro da discussão,
por vezes com argumentos apocalípticos, tentando sempre colocar o ónus sobre o
cidadão comum relativamente ao que não funciona ou funciona muito mal na gestão
dos produtos recicláveis.
A sociedade moderna tal como a vivenciamos, é cada vez
mais exigente na distribuição dos produtos, sejam alimentares ou outros, no que
respeita ao prazo de validade e à sua conservação, pelo que se colocam hoje
problemas complicados de resolver ao nível das embalagens, produzindo-se um
número assinalável de produtos ou subprodutos em matérias recicláveis. Sendo o
plástico um derivado de petróleo e o papel e o vidro de utilização intensiva de
energia na sua produção, entende-se que seria interessante investir em técnicas
de reutilização destes produtos ou da sua reciclagem para evitar que sejam
encaminhados a destino final e assim se desperdicem mais matérias-primas.
Chegados aqui, temos as empresas produtoras de embalagem
e as câmaras municipais, que detêm a responsabilidade da recolha e do
tratamento e destino final dos RSU, com os seus respetivos custos e
responsabilidades sociais.
Nos anos oitenta e noventa discutiu-se muito este tema e
a repartição dos custos inerentes à reciclagem. As câmaras acabaram por ficar
com a parte de leão, tendo que suportar uma boa parte dos custos da recolha, do
tratamento e do destino final dos resíduos. Claro que esta componente acabou
por ir sair do bolso dos contribuintes com as tarifas de RSU.
Mas as Câmaras sempre tiveram alguma relutância em
abordar este tema de uma forma inteligente e compreensível para os munícipes.
Preferiram a facilidade de umas campanhas de sensibilização e de uma cobrança
indireta baseada no consumo de água.
O problema da não existência de condições para alcançar
as metas estabelecidas para a reciclagem dos materiais recicláveis reside
exatamente aqui, nesta atitude desresponsabilizada das Câmaras e dos sucessivos
governos da nação. Nunca quiseram encarar de frente este problema, estudá-lo e
adotar as medidas que tornassem a reciclagem num ato responsável e ponderado de
cada cidadão.
A Tratolixo em 2003, enquanto autores do Plano Estratégico de
Resíduos de Cascais, Mafra, Oeiras e Sintra, estudou este assunto com
profundidade e apontou soluções que não foram aceites, com elevadas
responsabilidades nesta decisão dos atuais Presidentes de Câmara de Cascais e
Oeiras, respetivamente Carlos Carreiras e Isaltino Morais.
De uma forma simplista analisemos o estado da arte na
recolha de RSU em geral e dos materiais recicláveis em particular.
Um cidadão que não separe os seus resíduos tem a sua vida
facilitada: não precisa de tanto espaço em casa para guardar as várias frações
de resíduos, e apenas num saco e numa deslocação ao contentor resolve o seu
problema.
Existem mais contentores de RSU indiferenciado do que
ecopontos pelo que a distância percorrida pelo cidadão que separa os
recicláveis é maior para entregar esses materiais do que se se limitasse a
entregar RSU indiferenciado.
A política de algumas Câmaras em investir em
contentorização enterrada não ajudou. Os contentores sendo de maior capacidade,
existem menos e, em média, ficam mais longe do cidadão.
Os exemplos de recolha porta-a-porta foram abandonados,
sempre com a preocupação dos custos da operação e não com a comodidade dos
cidadãos.
E por último a patética forma de cobrar este serviço de
recolha, tratamento e destino final dos RSU. Em função da água consumida?
Eu, interessado neste assunto, que tive a oportunidade de
participar na elaboração do Plano Estratégico de Resíduos de Cascais, Mafra,
Oeiras e Sintra, especialmente na componente das recolhas e das soluções de
cobrança deste serviço, pergunto-me, cada vez que vou ao ecoponto depositar
resíduos de vidro, de plástico ou de papel, porque “carga de água” a minha
costela de cidadão responsável se mantém, quando não vejo tratamento
diferenciado por parte da Câmara onde resido de tentar premiar os cidadãos
conscientes nestas matérias ambientais.
Estes dois aspetos, a comodidade e a justiça tarifária se
não forem resolvidos não há metas que resistam.
O cidadão cumpridor tem que ter a sua tarefa simplificada
e tem que ter benefícios nos custos cobrados pelas Câmaras nas tarifas de
Resíduos.
O abandono das políticas de proximidade, como as recolhas
porta a porta, criaram um entrave ao crescimento dos materiais recolhidos seletivamente.
Se a isto juntarmos o fato de que o pagamento a efetuar pelo cidadão não tem
nada a ver com a tipologia dos resíduos que entrega para recolha e envio a
destino final, sejam separados para reciclagem sejam indiferenciados, então
fica explicado.
O problema das metas e dos níveis de reciclagem não é só um problema de cidadania! É também, e em maior percentagem, um
problema de justiça!
Justiça para os que separam, que devem ter os ecopontos
ou a recolha porta a porta de uma forma mais acessível e fácil do que aqueles
que se limitam a entregar resíduos indiferenciados. O que deve estar mais longe
da habitação do cidadão é o contentor do resíduo indiferenciado e não o contrário!
Justiça porque o cidadão cumpridor que separa as frações recicláveis
deve pagar menos do que o cidadão que não tem preocupações ambientais!
Não vai haver crescimento dos materiais reciclados sem
que estes dois aspetos sejam revistos pelas Câmaras e pelo Governo!